ADEUS DUCATI - OBRIGADO PELOS 142.308 KM
E aonde haviam apenas as trevas, se fez a luz em forma de Viraguinho.
As curvas eram difíceis, quadradas e quase que odiadas, e o treinamento se deu com muita estrada, na verdade, cerca de 1.500km rodados todos os meses para visitar minha filha, que na época tinha apenas 5 aninhos.
Depois veio a Shadow 600, maquinaço que me colocou com botas ao vento e me apresentou as bordas do Estado de São Paulo e seus vizinhos.
Ao troca-la por uma V-Strom 650, após rodar 100.000 km, já começava a ver que o mundo não era tãaaao grande assim, e mais interessante do que eu poderia imaginar.
Com a V-Strom veio Machu Picchu, Titicaca, San Pedro de Atacama, Ushuaia e uma volta completa no Brasil, com direito a navegação no Rio Amazonas e uma alucinante travessia pela BR-319.
Quando ela se foi, aos 105.000km, eu já tinha adquirido o gosto de virar velocímetros.
Foi então que veio para as minhas mãos, em forma de pagamento por serviços prestados à marca, uma DUCATI Multistrada S Touring, 1200 cilindradas e 150 cavalos de força impulsionando a motoca de apenas 190kg.
Era um foguete vermelho que de cara me levou para Itália, onde tive a honra e o privilégio de conhecer integrantes de vários DOCs – Desmo Owners Club – como Brasil, Portugal, Espanha, Itália e posteriormente Bolívia e Equador.
Em Misano/ITA, deixei minha marca como recordista do evento, percorrendo 14.500 km para estar ali – nunca na história da marca, e até hoje, um motociclista rodou tanto para participar do World DUCATI Week, a maior festa DUCATI no mundo.
De volta ao Brasil, o sonho não acabou.
Dei continuidade ao meu trabalho, apresentando palestras pelo país e guiando grupos em roteiros de médias e grandes distâncias.
De Multistrada foram 4 turmas para Machu Picchu, 3 turmas para o Atacama, 4 turmas para Rota das Cervejas (SP e RJ), entre várias outras para Serra do Rio do Rastro, Rastro da Serpente, Graciosa, Cambará do Sul, sem desconsiderar viagens solo para Uruguai e Argentina.
Em 2015 ela ficou exposta no Salão Duas Rodas, mais precisamente no stand da GIVI do Brasil, após retornamos (eu e a Elda) do Projeto Vulcões Andinos que nos levou a percorrer mais de 18.000 km até a Colômbia em busca dos mais incríveis vulcões.
Rodamos por asfalto e mesmo com pneu misto – o único para bitola de 190 – comemos areia e poeira por estradas de cascalho espalhadas pela Cordilheira dos Andes.
Neste tempo vi a DUCATI crescer e se retrair junto ao mercado brasileiro.
Apresentei palestras em Concessionárias que não existem mais como Porto Alegre, Santos, Rio de Janeiro e Ribeirão Preto.
Acredito que tenha influenciado muitos motociclistas a comprarem suas máquinas italianas, bem como irritei alguns extremistas quando expus os problemas da motoca – inerentes ao modelo e a marca, são mais comuns do que se pensa, principalmente quando se roda cerca de 50.000 km por ano.
Aos 110.000km me disseram que a moto já tinha “cumprido o seu papel, e que a marca era conhecida por seu desempenho, e não durabilidade”.
Que ideia absurda de coxinha – mas beleza, eu consigo respeitar essa opinião.
De forma alguma minha intensão foi denegrir a imagem da marca, mas como proprietário legítimo da moto – apesar de uma minoria acreditar que a moto me foi dada de presente e que eu ainda recebia salário da montadora (rs) – me senti e me sinto impelido a orientar os amigos que gentilmente seguem o meu trabalho, sobre este ou aquele ponto, positivo ou não, dos modelos que piloto.
Eu escrevo e trabalho para aqueles que rodam de moto, e estes me entendem bem.
Os perrengues aconteceram, é verdade, até virou livro onde nele relato coisas que nunca foram publicadas e que o grande público sequer imagina que passamos, mas essas dificuldades só foram possíveis porque fomos para estrada, nos lançamos contra horizontes nunca antes desbravados por nós, e os apertos vividos só foram possíveis porque existia confiança na máquina e uma enorme vontade de tomar vento na cara.
Agora, após 4 anos e 142.308 km rodados (dos 150mil se somado os Test Riders feitos com a marca), transferi a minha DUCATI Multistrada S Touring que nunca teve nome, que quebrou a linhagem de batismos, porque estávamos mais interessados em rodar do que conversar com uma samambaia vermelha na garagem.
Fomos felizes, vimos lugares incríveis, fizemos amizades duradouras no Brasil e em mais 10 países por onde passamos com esta motoca. Sofremos, passamos apertos, choramos e superamos todos eles.
Entreguei as chaves, os documentos, lhe dei um abraço forte, um afago no tanque e segui o meu caminho sem olhar para trás.
Saudades é uma coisa que se sente quando não estamos felizes, e eu não tenho motivo para tristezas.
Deixo registrado o meu agradecimento a DUCATI do BRASIL pelas parcerias feitas em 2014 e 2015, pelos mecânicos das Concessionárias DUCATI Porto Alegre, Curitiba, Santos, Pinheiros, Ribeirão Preto, Campinas, Brasília, Santa Cruz de la Sierra e Quito, bem como os amigos da Target Race pelas horas dedicadas as manutenções deste canhão que ajudou a forjar o motociclista que sou hoje.
Agora seguirei estrada com outra marca, outro modelo, mas como aprendi na Itália, berço da DUCATI, ser Ducatista não significa apenas ser proprietário deste ou daquele modelo, mas sim carrega-la no coração.
A DUCATI faz parte da minha história, e isso jamais será apagado.