Elda - garupa & pesquisadora

Elda, a garupa do Diário de Motocicleta

Elda (natural de Piracicaba/SP)

Quando eu era pequena, minhas bonecas não se casavam - arrumavam as malas pra viajar o mundo. Dito isso, minha vida fica muito mais fácil de ser compreendida; ela se divide em duas partes: antes e depois da moto.

Sou de Piracicaba e até os meus 29 anos posso dizer que era uma menina comum do interior de São Paulo. Hiper mega vaidosa, vivia cercada de maquiagens, cremes, perfumes, roupas, bolsas e sapatos da moda. Ou seja, patricete total (aliás, esta ainda é minha essência).
Também terminava um relacionamento muito chaaaaato e sem futuro. Estava pra baixo emocionalmente e não fazia ideia que minha vida morna iria ferver.

Devo dizer que nunca fui ligada em motos, mas como não me apaixonar se foi uma destas maravilhas que serviu de cupido e me trouxe o único amor que já tive na vida?

Como toda pessoa moderna (e desesperada) eu e o Guga nos conhecemos pela internet em outubro de 2006. Depois de um mês de papo furado meloso e apaixonado, resolvemos nos encontrar em Louveira, cidadezinha ao lado de Campinas, SP.

Fui de ônibus. Ele de moto: uma virago 250 cc preta, toda customizada com pintura fosca. Linda, linda, linda.
O piloto também não era de se jogar fora: alto, forte, olhos verdes com um look despojado (que toda mulher ama), jeans, camiseta, jaqueta de couro e coturno. Mais gato impossível. O mais legal é que ele realmente era o cara das fotos.

Gente, eu não tinha nenhuma intimidade com motos, (aliás, só tinha andado algumas vezes de garele com a minha prima), mas sentei na garupa da Viraguinho e fui toda feliz pra Louveira, me achando a "descolada".

Pra mim esta experiência foi uma delícia, mas uma tortura para o meu marido. Eu não tinha ideia de como me posicionar e me mexia o tempo todo, tentando me ajeitar no banco traseiro magriiiinho da Virago. Ele gentil, chamou minha atenção para o perigo de cairmos, e a partir dali, não me mexi mais.

Depois de um ano namorando a distância nos casamos e me mudei pra SP, e com o tempo fui melhorando minha postura e com as corridas constantes de deslocamento na cidade, viagens e passeios de bate volta fui adquirindo confiança e experiência.

Em 2010 fizemos nossa primeira viagem de longa distância, de São Vicente, litoral de SP até Salvador, BA - Projeto Êxodo de Moto. Jovens, ousados e inexperientes, fomos sem medo e com poucas informações do que encontraríamos pelo caminho.

Na época tínhamos uma Shadow 600 cc, apelidada carinhosamente de Shelda (uma singela homenagem a esta que vos escreve). Foram 24 dias felizes de perrengues leves a moderados (sou muito fofa) que deu inicio a minha nobre função atual no Diário de Motocicleta: ser pesquisadora de conteúdo WEB.

A partir desta experiência comecei a aprofundar minhas pesquisas antes de qualquer viagem.
Hoje, mais cuidadosa, sou expert em fuçar e pesquiso a fundo a cidade e/ou país que visitamos, e não apenas os pontos turísticos; isto inclui história, arquitetura, economia, agricultura, geografia, clima, gastronomia, deslocamento urbano, sistema de saúde, agências de turismo, correios, embaixada, curiosidades e expressões de linguagem (gírias em geral), um pouco do idioma, lojas de serviços pra moto, etc.

Realizar um bom planejamento, pra mim, é indispensável porque quando queremos fazer alguma alteração, temos muito mais confiança em fazê-lo, e nos sentimos seguros em sair da rota traçada para explorar novos caminhos com muito mais liberdade.

Em 2011, realizamos nossa primeira grande aventura em terras estrangeiras: Bolívia, Paraguai, Peru, Argentina e Chile. Fomos descobrir o Peabiru, o antigo Caminho dos Incas.
Munida de caderninhos e anotações partimos para desvendar o fascinante e histórico caminho. Percebi que além das anotações previamente transcritas eu detinha o poder de colher informações mais detalhadas, e algumas inéditas, que nem sempre encontramos na Internet e fomentar o Diário de Motocicleta.

Eu não fazia ideia da beleza do mundo. Foi ali que me apaixonei de vez pelas viagens de moto e pelos lugares incríveis que ela podia nos levar e pensei comigo: Por que um hobby não pode virar uma profissão?

O Guga sempre me dizia que isso era possível, mas eu como uma boa capricorniana prática e racional, não enxergava esse potencial.
Pobre de mim, nessa época eu era tonta, insegura, não acreditava que seria capaz de fazer tudo o que fiz até hoje.

Em 2012 quando planejamos ir juntos ao Ushuaia, eu estava muito empolgada, mas adoeci no inicio da viagem e aprendi que por mais que eu queira uma coisa, se eu não estiver pronta, simplesmente não poderei realizar.

Amadureci neste momento e passei a respeitar mais os meus limites.

Em 2013, fomos conhecer os estádios que sediariam os jogos da Copa de 2014.
Viajar este Brasilzão que eu amo é sempre emocionante. Nesta viagem tínhamos um objetivo mais jornalístico, mostrar o andamento das obras dos estádios, e mais uma vez, as pesquisas colhidas ao longo de seis meses de trabalho fizeram toda a diferença.

Encontramos amigos queridos ao longo do caminho, conhecemos vários outros. Éramos recebidos com carinho até por desconhecidos que viam a nossa moto adesivada e tiravam fotos, faziam perguntas e desejavam boa sorte.

Até este momento a viagem estava fácil, tranquila, quase tudo dentro do planejado. Mas, eis que surge uma pedra no caminho. Ou melhor, uma imponente Floresta Amazônica. O Guga, claro, me avisou que atravessaríamos a selva, quais seriam os desafios: dormir em uma barraca durante dois dias, tomar banho de rio, dieta a base de biscoitos, Cup Noodles, sanduiches de pão com atum, bolo de laranja Pulmann e água.

Neste projeto "Rodando as Cidades da Copa", eu não fazia ideia de que no nosso país, eu faria a coisa mais difícil da minha vida: dormir não os dois dias planejados no início do projeto, mas 4 noites no meio da floresta mais gigantesca da Terra - e detalhe, sem ter recebido nenhum tipo de treinamento pra isso, apenas a confiança no nosso planejamento.

É claro que houve discussões, não somos o Casal Maravilha, mas são nestes momentos extremos que resolvemos qualquer crise existencial e nossos valores e motivações se tornam muito claros. As adversidades nos mantém alertas e exigem urgência na tomada de decisões.

Depois do batismo florestal superamos todos os problemas com muito mais energia, ficamos mais amigos, mais responsáveis um com o outro.

Em 2014, o Guga partiu para um projeto maravilhoso, uma parceria da Ducati do Brasil e a Ducati Itália para conhecer o maior encontro da marca no planeta, o World DUCATI Week em Misano/Itália.
Fiquei de fora, mas estava com ele. Estamos sempre juntos, mesmo quando ele viaja sozinho, isso por que temos uma cumplicidade de brothers.

Em 2015 veio nosso projeto mais ambicioso, Vulcões Andinos, onde rodamos até Manizales na Colômbia, contabilizando quase 18.000 km.
Neste projeto a aventura era palpável, o Guga, fisicamente superior a mim escalou três vulcões, dois chilenos e um colombiano - eu só escalei um, ou melhor desci a pé até a cratera e depois subi de mula o Vulcão Quilotoa.
Fiquei muito orgulhosa do meu marido e jamais imaginei que um dia faríamos algo tão fantástico.

Escrevendo aqui pra vocês parece ser tudo muito simples. Mas não é.
Pra viajar de moto você precisa ir preparada para os sobressaltos, manter a mente aberta e o molejo na cintura. Engraçado, mas muita gente acha que eu sofro, que é uma vida muito dura viajar sobre duas rodas.

As pessoas sempre me perguntam: mas como você consegue viajar tantas horas de moto?

Calma gente, eu explico.
Primeiro você tem que amar. Gostar só não basta. Tem que ser apaixonada. No inicio a moto era apenas um meio de transporte. Hoje é minha melhor amiga. Segundo, sou apaixonada pelo meu marido. Terceiro, sou aventureira. Quarto, amo viajar. Quinto sou corajosa, ou louca mesmo, você decide.

Enquanto isso, peço licença e vou terminando por aqui, por que tenho pesquisas por terminar, por que pra gente, a estrada não acaba nunca!


Elda
Nos vemos na estrada!

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