OFF ROAD ROOTS – O FIM

15º dia de viagem
Cidade: Sur de Lípez/BO | Categoria: Diário do Piloto
Revisado em: 25/10/2017
Diário de Motocicleta

Acordamos por volta as 6h da manhã, de frente para Laguna Colorada, a mais de 4.270m de altitude (o lugar mais alto em que passamos a noite) e com uma temperatura de -10°C.
Apesar desse friozão, dormimos apenas com uma manta, por que as paredes do Hostal eram feitas de Adobe, blocos de barro, pedra e palha, altamente isolante.

Quem sofreu mesmo foram os equipamentos eletrônicos que ficaram no carro, que simplesmente não ligavam... note, câmeras, drone... tudo morto e congelado... tive que ligar o aquecedor e dar um tempo para fazer as primeiras imagens do dia.

Então finalmente saímos com um objetivo ambicioso de rodar mais de 350 km dentro do Parque Eduardo Avaroa, e voltar a tempo para o Uyuni para entregar o Jeep, e sem perder tempo, saímos em direção à Árbol de Piedra, distante uns 25 km do nosso alojamento.
Quando chegamos, éramos os primeiros... não tinha ninguém por lá e conseguimos fazer fotos sossegadamente por uns 25 minutos, até que 4x4 com turistas começaram a aparecer de todos os lados.

Enquanto uma fila se formava na frente da formação fantasticamente esculpida pela natureza, a Elda saia pelo jardim de pedras para fotos, e eu me preparava para subir o drone.

Zanzei pra lá, zanzei pra cá, tudo em meio a pane eletrônica, onde o celular acusava bateria fraca, mesmo com a carga completa.

Com medo, desci o danado dos céus, chamei a Elda e partimos para umas fotos na Laguna Colorada, que, apesar de ter sido nosso quintal, as melhores fotos só poderiam ser feitas do alto de um mirante.

Então vazamos em direção a ele, e antes de parar na cancela de Controle do Parque, pegamos uma estradinha à esquerda, e subimos uma colina, parando bem de frente a Laguna.

Pela manhã a cor não é tão intensa, e depende muito da quantidade de nuvens no céu. Por sorte o dia estava lindo e, apesar das fotos ficarem boas, por que não voar novamente?

Armei o drone e decolei.

Tanto ele como o celular começaram a dar pane (creio que por conta do frio) e o medo que o trem despencasse no meio da laguna me dava frio na barriga, fiz umas fotos, filmei... mas uma série de alarmes começaram a tocar no meu rádio, que me fizeram dar meia volta.

Neste momento ouvi uma motinho se aproximando e do nada um oficial desceu gritando – ¡No se puede volar! ¡Desciende este drone ahora!

Pedi desculpas e continuei lutando com o drone... ele insistiu que eu descesse naquele exato momento, e respondi que estava com problemas, mas que estava trazendo-o de volta... e como de costume fui pega-lo em pleno vôo e pá... meti os dedos nas hélices.

Abre aspas... Este modelo tem um sensor que detecta o solo, mas também sabe qual a sua altitude, então quando você coloca a mão por baixo, ele deduz que é um obstáculo e acelera para subir, mas com o espertão segurando, as hélices giraram ainda mais forte e não me pouparam alguns talhos nos dedos... fecha aspas.

O oficial não se sensibilizou com meu grito e sague escorrendo, e disse que era proibido voar em Parques Nacionais e que deveria recolher o equipamento.

Eu juro que não sabia se chorava de dor nos dedos ou pela iminente perda do drone.

Imediatamente o guardei no carro e comecei a explicar que estava fazendo um tour pela Bolívia, que costumava trazer motociclistas para conhecer o país dele, que eu era um homem que respeitava as leis, e que ao entrar no Parque ninguém havia me dito sobre tal proibição... blá, blá, blá... e pedi que ele me desse uma multa, mas que não me levasse o aparelho, então ele me perguntou que de que forma saberia que eu não iria mais voar, então enchi o peito e disse - ¡Soy un hombre de palabra!

E não é que o cara pois fé!

Disse que então eu deveria acompanha-lo até o Posto de Controle para descarregar as imagens do cartão, e que ele o mesmo seria formatado. Concordei imediatamente e comecei a buscar a Elda que havia saido para fazer fotos perdendo todo aquele perrengue.

No que ele subiu na motinha e disse que me esperava lá embaixo, comecei a caçar o notebook no meio da bagagem para garantir um backup. Nisso a Elda chegou, viu meus dedos sangrando e assustada ouviu eu contar todo o episódio com o oficial.

E nada do note ligar com aquele frio.

Enquanto ela enrolava meus dedos em uma meia, entramos no carro e seguimos para guarita, já estávamos demorando muito e poderiam desconfiar que estávamos fazendo cópias.

Ah! Como eu queria ter conseguido.

No Posto de Controle, desci com uma meia vermelha numa mão e o drone na outra, entrei em uma salinha e um outro oficial pediu meus tickets de entrada no Parque, apresentei e então ele disse que fomos denunciados por outro turistas por estarmos voando na Árvore de Pedra – FDPs!

Novamente pedi desculpas que foram aceitas, mas insistiram em copiar as imagens e apagar nosso cartão.

Um terceiro oficial veio fazer a cópia, e como era um microSD, ele usou o próprio celular como ponte e passou as imagens para o computador, assistindo aos filmes na sequencia.

Ficaram top! Apagaram o meu cartão e me devolveram desejando boa viagem.

Seguimos dali o mais rápido possível para o Hostel, pois eu precisava lavar meus dedos e ver a extensão dos danos, que pela quantidade de sangue, algo me dizia que precisaria de pontos... mas até que não, eram fundos, perto das unhas dos dedos médio e anelar da mão direita, e apesar da dor, enrolei um Band-Aid em cada um e voltamos para estrada... já tínhamos perdido quase uma hora nessa brincadeira, e ainda precisávamos ira até a divisa com o Chile.

Rodamos cerca de 85 km em duas horas por caminhos iguais ao dia anterior, que se alternavam entre pedras, cascalhos, areia fina, ribanceiras e ladeiras.

Não gosto de carro (acho que já disse isso), não tenho carro e eles me dão dores nas costas, nos joelhos e no resto do corpo, além de me dar sono... e dirigindo pela primeira vez em terrenos acidentados, até que estava me saindo muito bem.

Quando finalmente vimos a ponta do Vulcão Licancabur, que sempre vejo do outro lado quando vou para San Pedro do Atacama, eu e a Elda começamos a gritar dentro do carro como dois retardados.

Chegamos primeiro na Laguna Branca, que do Passo Jama é possível ver um pedacinho, e mais a diante, ficamos de boca aberta diante da Laguna Verde... que espetáculo de cenário.

Apesar do frio e do vento, descemos para fazer fotos e filmagens, e por mais que eu quisesse descumprir a lei, ali seria impossível voar.
Me contentei com vários clicks e tomadas com GoPro, e por volta do meio dia, começamos nosso longo caminho de volta.

Subidas em primeira marcha com a opção 4x4 Low, ribanceiras em segunda marcha e segurando no freio... penhascos do nosso lado e gigantes 4x4 passando por nós, cobrindo o Jeep de terra... aliás, o carro, nossas bagagens e nós éramos só poeira... deu até vergonha devolver o Jimny daquele jeito.

Por volta das 4h30, saímos do Parque e entramos na Ruta 701, também de terra, mas como citei no artigo anterior, bem compactada, onde deu para rodar na casa dos 100 km/h – não adianta que o carrinho não vai mais que isso.

Quando finalmente vimos a placa Uyuni, um caminhão que já vinha me lambendo há alguns quilômetros me fez avançar sobre um cruzamento de linha férrea sem reduzir e pá... estourou meu pneu.

Sem acostamento tive que rodar alguns metros com o pisca-alerta ligado (aqui isso é sinal que você vai encostar), para que o bonitão diminuísse e finalmente eu pudesse parar.

Estávamos a cerca de 5 km do hotel, exaustos, eu com os dedos latejando e tendo que trocar um pneu furado. Ninguém merece ficar em casa no sábado a noite não é mesmo?

Chegamos no hotel na hora de entregar o carro, estropiados e com um sorriso de lado a lado, imundos e com fome, mas completamente realizados.

Valeu muito esse dois dias rodando cerca de 770 km de carro.
Agora só queremos motocar e que os amigos apreciem as fotos e venham encarar o Sur de Lípez.

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